segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Cinema para mim

A minha relação com o cinema, onde tento trabalhar hoje em dia, mas que sinceramente prefiro apenas apreciar


O cinema como qualquer outra arte para mim é sentimento. Se sinto, sinto... se não sinto, não tento arranjar provas filosóficas para tentar explicar o que devia, ou não, sentir ou pensar. Ou me faz pensar ou me faz sentir, se fizer as duas coisas já não está mau.

O que me emociona nos filmes são valores e virtudes, Inocência, nobreza, capacidade de sacrifício, injustiça...tantos ...é claro...o amor (já que se fala de sacrifício), qualquer um destes com a luz certa e situação certa me fazem rir, chorar, pensar.

Cada vez mais acredito que se se vir suficientes filmes de amor, ao longo de uma vida, a esperança desse mesmo amor aparecer, não morrerá. Tendo em conta também que para mim os filmes serviram sempre como treino para algo que, a acontecer, será parecido (será assim tão ridículo pensar assim? Não se eu assim o desejar).

Da comédia à tragédia, da psicose à ignorância. Eu sei que estou a apontar bastante alto mas devido à variedade existente escolho um que me marcou BASTANTE, e nem tudo são rosas neste filme. Mas sinto que se conseguir sentir um décimo do que senti ao ver este filme vou ficar bem.

Venho aqui escrever-vos sobre um dos melhores filmes que vi.

"A woman under the influence", 1974, de John Cassavetes, com Gena Rowlands e Peter Falk.

Escrevo sobre este filme pois mudou completamente a minha maneira de ver cinema, não porque fala da sociedade, do que é "normal" ou não, da inocência ou simplesmente de amor, mas porque fala de duas pessoas e da sua vida, como nunca outro filme me falou.

Eu estou neste momento num 3º estado de observação e pensamento cinéfilo. O primeiro estado foi o normal, o que a maioria das pessoas sem formação no assunto assimila quer queira quer não. Pensado mas não muito.

Passei para um 2º estado quando a meio do meu curso de cinema e tendo já uma percepção bastante abrangente da técnica e visto filmes que a maioria das pessoas nem sonha, me apercebi que ver cinema era algo mais do que passar tempo, era uma enorme oportunidade de meditar e acreditar na visão de 1001 pessoas diferentes, enriquecer as emoções, quer estas estivessem bem escritas ou não, bem realizadas ou não, mas sobretudo com histórias diferentes para contar, muitas delas parecidas com a minha.

Um dos filmes que me ajudou bastante a atingir este 2º grau de percepção foi "2001, Odisseia no espaço" de Stanley Kubrick, falo deste filme pois adormeci as duas primeiras vezes que tentei vê-lo! e admitindo que se tem de estar no estado de espírito certo para ver certo tipo de filmes, foi um filme que me marcou por me apaixonar mais a cada vez que o vejo. Dá-me sempre ideias novas e algo mais que ainda hoje em dia não percebo. Tendo tirado o curso há já 4 anos pensei que pouco mais me maravilharia a ponto de mudar a minha percepção do cinema como arte, estava redondamente enganado.

Para simplificar, tudo antes de passar ao 3º estado eram "histórias", com este filme, grande parte das minhas antigas paixões morreram e nenhuma nasceu até hoje. O "2001" ainda continua lá, assim como muitos outros, mas esses outros, até tive de fazer agora um esforço para me lembrar dos nomes deles, talvez provando que algo realmente mudou na minha maneira de ver cinema. já não são interessantes, falta-lhes sumo!

"A woman under the influence" faz me pensar que todos os outros filmes não passam de histórias com seguimentos, actos, conclusões, de muito bom a muito mau, mas não passam disso.

Este filme é uma vida! e um bocado à semelhança de um bom vinho, vive connosco e será diferente em qualquer dia que o vejamos, ou que abramos a garrafa. Faz parte de um cinema realista que só agora comecei a explorar, mas foi mais do que isso para mim, foi imprevisível, deslumbrante, com duas das melhores interpretações que já vi, TOCOU-ME profundamente.

Também tem história pois o cinema raramente vive sem isso, mas de uma perspectiva tão humana que espero que todos os filmes que eu volte a ver até ao fim da minha vida sejam sobre aquele casal. TOCOU-ME também como cidadão de uma sociedade formatada pelos meus antepassados, pela rebeldia, onde o meu sentimento de liberdade é espacial e raramente mental. Fala-se muito, faz-se pouco. Com uma história tão simples como "Uma dona de casa maluca..." fez-se aqui uma obra de arte de valor incalculável, especialmente porque eu nem estava em nenhuma variação de humor particular quando o vi, o que às vezes altera-me um bocado a percepção.

Grande parte dos filmes de hoje em dia são plásticos, um bocado à semelhança com a nossa vida, e estou neste momento a odiar-me por escrever isto, mas é infelizmente verdade. Não passam de corridas sentimentais fáceis e muito bem estruturadas, tudo é previsível, quando temos a sorte de serem imprevisíveis, e não me refiro aqui só no final, já o vimos antes, não sabemos nem bem onde, nem porquê, mas já vimos antes.

Este filme é imprevisível de uma ponta à outra mesmo tendo um fio condutor bastante forte e previsível! mas deixando-nos vaguear in-loco até à Lua e se nos permitirmos, voltar.

Grande Cassavetes, Grande Gena e Grande Peter e GRANDES todos os outros que de alguma maneira puseram o dedo nesta obra, obrigado a todos.

Estou cansado de escrever e vocês de me lerem, vejam o filme por vocês...

...mas não o descasquem, deixem-no ser o que é PARA VOCÊS.


P.s. Não façam criticas em blogs só porque vos apetece escrever sobre filmes mesmo, MUITO, MUITO, MUITO, MUIIIIIITO BONS, é ridículo.

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